Lembro que quando tinha uns 10 anos era uma magrela sem jeito, e uma menina do colégio disse a famosa frase "te pego lá fora". Aquilo me causou uma náusea misturada com aperto no peito. Mais tarde soube que era medo. Naquele dia saí do colégio mais cedo - escondida, lógico - e chorei o resto do dia embaixo da coberta. No dia seguinte fugi do colégio de novo, e diversos outros dias. Um tempo depois vi que a menina não iria mesmo fazer nada comigo. Acho que ela só quis se divertir um pouco. Conseguiu.
A gente cresce e se torna adulto, cheio de certezas e disposição. Comemos onde bem entendemos, passeamos com as mãos soltas, brigamos com o parceiro, falamos alto com o cachorro. É isso. Parecemos donos do próprio nariz. Coragem fingida.
Corajoso é quem não tem medo de assumir a homossexualidade, ou o fato de ter uma doença terminal. É aquele que chora na frente de quem for, que dança sem se importar com os risinhos, que desfila com a pessoa que ama, que diz Eu te amo pra quem quiser ouvir também, que ri alto, que não aceita abortar por causa dos pais, que não fica justificando seus atos. O corajoso leva a vida sem neura, sem relógio. Ele busca viver o dia assim em 24 horas, e não em 15 - como os engravatados. O corajoso morre amando a si mesmo, mesmo que ninguém diga que ele seja bom.
Corajoso foi Cazuza, ao dizer "morrer não dói" quando todos sofriam por ele. Foi Zumbi, ao deixar o local em que vivia pra lutar pelos escravos. Foi minha vó, que ficou viúva - grávida - aos 25 anos e conseguiu criar bem todos os filhos. Corajosa foi a minha vizinha, que foi abandonada pelo marido quando estava com uma doença horrível, e hoje está recuperada e independente. Corajoso foi meu pai, que brigou por mim quando um doido invadiu a família querendo desestruturar nosso relacionamento familiar.
As coragens estão aí, sendo vividas por pessoas que escolhem fingir, ou escolhem ser.
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